Jardim dos Mestres

Magandiya Sutta (Majjhima Nikaya 75)

1. Assim ouvi. Certa ocasião o Abençoado estava no país dos Kurus em uma cidade Kuru denominada Kammasadhamma, num leito de capim no cômodo com lareira de um brâmane pertencente ao clã Bharadvaja.

2. Então, ao amanhecer, o Abençoado se vestiu e tomando a tigela e o manto externo, foi para Kammasadhamma esmolar alimentos. Depois de haver esmolado em Kammasadhamma e de haver retornado, após a refeição ele foi até um certo bosque para passar o resto do dia. Tendo entrado no bosque, ele sentou à sombra de uma árvore.

3. Então o errante Magandiya, enquanto caminhava e perambulava fazendo exercício, foi até o cômodo com lareira do brâmane pertencente ao clã Bharadvaja. Lá, ele viu um leito preparado com capim e perguntou ao brâmane: “Para quem foi preparado esse leito com capim no cômodo com lareira do Mestre Bharadvaja? Parece a cama de um contemplativo.”

4. “Mestre Magandiya, é para o contemplativo Gotama, o filho dos Sakyas, que adotou a vida santa deixando o clã dos Sakyas. E acerca desse mestre Gotama existe essa boa reputação: ‘Esse Abençoado é um arahant, perfeitamente iluminado, consumado no verdadeiro conhecimento e conduta, bem-aventurado, conhecedor dos mundos, um líder insuperável de pessoas preparadas para serem treinadas, mestre de devas e humanos, desperto, sublime.’ Esse leito foi preparado para o Mestre Gotama.”

5. “Sem dúvida, Mestre Bharadvaja, é uma visão ruim quando vemos a cama daquele destruidor do crescimento, [1] Mestre Gotama.”

“Seja cuidadoso com aquilo que você diz, Magandiya, seja cuidadoso com aquilo que você diz! Muitos nobres sábios, brâmanes sábios, chefes de família sábios e contemplativos sábios têm plena confiança no Mestre Gotama e foram treinados por ele no nobre caminho, no Dhamma que é benéfico.”

“Mestre Bharadvaja, mesmo se víssemos esse Mestre Gotama cara a cara, diríamos na cara dele: ‘O contemplativo Gotama é um destruidor do crescimento.’ Por que isso? Porque isso está registrado nas nossas escrituras.”

“Se o Mestre Magandiya não tiver objeção, posso relatar isso ao Mestre Gotama?”

“Que o Mestre Bharadvaja fique tranqüilo. Conte aquilo que eu acabei de dizer.”

6. Enquanto isso, com o ouvido divino, que é purificado e ultrapassa o humano, o Abençoado ouviu essa conversa entre o brâmane do clã Bharadvaja e o errante Magandiya. Então, ao anoitecer o Abençoado se levantou da meditação, foi para o cômodo com lareira do brâmane e sentou-se na cama com capim que havia sido preparada para ele. Então o brâmane do clã Bharadvaja foi até o Abençoado e ambos se cumprimentaram. Quando a conversa amigável e cortês havia terminado ele sentou a um lado. O Abençoado perguntou: “Bharadvaja, você teve alguma conversa com o errante Magandiya acerca desta cama com capim?” Quando isso foi dito, o brâmane, espantado e com os cabelos em pé, respondeu: “Queríamos contar ao Mestre Gotama exatamente sobre isso, mas o Mestre Gotama se antecipou.”

7. Mas essa conversa entre o Abençoado e o brâmane do clã Bharadvaja não foi concluída pois então o errante Magandiya, enquanto caminhava e perambulava fazendo exercício, chegou no cômodo com lareira do brâmane e se dirigiu ao Abençoado. Ambos se cumprimentaram e quando a conversa cortês e amigável havia terminado, ele sentou a um lado. O Abençoado disse:

8. “Magandiya, o olho sente prazer com as formas, goza com as formas, se delicia com as formas; isso foi domado, guardado, protegido e contido pelo Tathagata, e ele ensina o Dhamma para a sua contenção. Foi com referência a isso que você disse: ‘O contemplativo Gotama é um destruidor do crescimento’?”

“Foi com referência a isso, Mestre Gotama, que eu disse: ‘O contemplativo Gotama é um destruidor do crescimento.’ Por que isso? Porque isso está registrado nas nossas escrituras.”

“O ouvido sente prazer com os sons… O nariz sente prazer com os aromas… A língua sente prazer com os sabores… O corpo sente prazer com os tangíveis… A mente sente prazer com os objetos mentais, goza com os objetos mentais, se delicia com os objetos mentais; isso foi domado, guardado, protegido e contido pelo Tathagata, e ele ensina o Dhamma para a sua contenção. Foi com referência a isso que você disse: ‘O contemplativo Gotama é um destruidor do crescimento’?”

“Foi com referência a isso, Mestre Gotama, que eu disse: ‘O contemplativo Gotama é um destruidor do crescimento’ Por que isso? Porque isso está registrado nas nossas escrituras.”

9. “O que você pensa, Magandiya? Aqui, alguém pode no passado ter desfrutado o prazer através das formas percebidas pelo olho que são desejáveis, agradáveis e fáceis de serem gostadas, conectadas com o desejo sensual e que provocam a cobiça. Mais tarde, tendo compreendido como na verdade é a origem, a cessação, a gratificação, o perigo e a escapatória no caso das formas, ele poderá abandonar o desejo pelas formas, remover a febre pelas formas e permanecer sem sede, com a mente em paz no seu interior. O que você diria para ele, Magandiya?” – “Nada, Mestre Gotama.”

“O que você pensa, Magandiya? Aqui, alguém pode no passado ter desfrutado o prazer através dos sons percebidos pelo ouvido… dos aromas percebidos pelo nariz… sabores percebidos pela língua… tangíveis percebidos pelo corpo que são desejáveis, agradáveis e fáceis de serem gostados, conectados com o desejo sensual e que provocam a cobiça. Mais tarde, tendo compreendido como na verdade é a origem, a cessação, a gratificação, o perigo e a escapatória no caso dos tangíveis, ele poderá abandonar o desejo pelos tangíveis, remover a febre pelos tangíveis e permanecer sem sede, com a mente em paz no seu interior. O que você diria para ele, Magandiya?” – “Nada, Mestre Gotama.”

10. “Magandiya, no passado quando vivia a vida em família, eu desfrutava o prazer provido e dotado dos cinco elementos do prazer sensual: com as formas percebidas pelo olho… com os sons percebidos pelo ouvido… com os aromas percebidos pelo nariz… com os sabores percebidos pela língua… com os tangíveis percebidos pelo corpo, que são desejáveis, agradáveis e fáceis de serem gostados, conectados com o desejo sensual e que provocam a cobiça. Eu tinha três palácios, um para a estação das chuvas, um para o inverno e um para o verão. Eu vivia no palácio para a estação das chuvas durante os quatro meses da estação das chuvas, desfrutando o prazer com músicos que eram todas mulheres, e eu não ia até o palácio que estava mais abaixo.[2] Mais tarde, tendo compreendido como na verdade é a origem, a cessação, a gratificação, o perigo e a escapatória no caso das formas, eu abandonei o desejo pelas formas, removi a febre pelas formas e permaneci sem sede, com a mente em paz no seu interior. Eu vejo outros seres que não estão livres da cobiça pelos prazeres sensuais sendo devorados pelo desejo pelos prazeres sensuais, queimando com a febre pelos desejos sensuais, se entregando aos prazeres sensuais, e eu não os invejo, nem sinto prazer nisso. Por que isso? Porque existe um deleite, Magandiya, que está afastado dos prazeres sensuais, afastado dos estados prejudiciais, que ultrapassa até mesmo o prazer divino. [3] Como eu me deleito nisso, não invejo o que é inferior, nem sinto prazer naquilo.

11. “Suponha, Magandiya, que um chefe de família ou o filho de um chefe de família fosse rico, com grande riqueza e grandes posses, e tendo sido provido e dotado dos cinco elementos do prazer sensual, ele desfrutasse do prazer com as formas percebidas pelo olho… com os sons percebidos pelo ouvido… com os aromas percebidos pelo nariz… com os sabores percebidos pela língua… com os tangíveis percebidos pelo corpo que são desejáveis, agradáveis e fáceis de serem gostados, conectados com o desejo sensual e que provocam a cobiça. Tendo boa conduta com o corpo, linguagem e mente, na dissolução do corpo, após a morte, ele renasce num destino feliz, no paraíso, em companhia dos devas do Trinta e três; e lá, cercado por um grupo de ninfas do Bosque de Nandana, ele desfruta o prazer, provido e dotado dos cinco elementos do prazer sensual divino. Suponha que ele visse um chefe de família ou o filho de um chefe de família desfrutando o prazer, provido e dotado dos cinco elementos [humanos] do prazer sensual. O que você pensa, Magandiya? Aquele jovem deva cercado pelo grupo de ninfas do Bosque de Nandana, desfrutando o prazer, provido e dotado dos cinco elementos do prazer sensual divino, invejaria o chefe de família ou o filho do chefe de família devido aos cinco elementos do prazer sensual humano, ele retornaria ao prazer sensual humano?”

“Não, Mestre Gotama. Por que não? Porque o prazer sensual divino é mais excelente e sublime que os prazeres sensuais humanos.”

12. “Da mesma forma, Magandiya, no passado quando vivia a vida em família, eu desfrutava o prazer, provido e dotado dos cinco elementos do prazer sensual: com as formas percebidas pelo olho… com os sons percebidos pelo ouvido… com os aromas percebidos pelo nariz… com os sabores percebidos pela língua… com os tangíveis percebidos pelo corpo que são desejáveis, agradáveis e fáceis de serem gostados, conectados com o desejo sensual e que provocam a cobiça. Mais tarde, tendo compreendido como na verdade é a origem, a cessação, a gratificação, o perigo e a escapatória no caso das formas, eu abandonei o desejo pelas formas, removi a febre pelas formas e permaneci sem sede, com a mente em paz no seu interior. Eu vejo outros seres que não estão livres da cobiça pelos prazeres sensuais sendo devorados pelo desejo pelos prazeres sensuais, queimando com a febre pelos prazeres sensuais, se entregando aos prazeres sensuais, e eu não os invejo, nem sinto prazer naquilo. Por que isso? Porque existe um deleite, Magandiya, que está afastado dos prazeres sensuais, afastado de estados prejudiciais, que ultrapassa até mesmo o prazer divino. Como eu me deleito nisso, não invejo o que é inferior, nem sinto prazer naquilo.

13. “Suponha, Magandiya, que houvesse um leproso com feridas e chagas nos membros, sendo devorado por vermes, coçando as crostas das feridas com as unhas, cauterizando as feridas do corpo com carvão em brasa. Então os seus amigos e companheiros, seus pares e parentes, trouxessem um médico para tratar dele. O médico prepararia um remédio para ele, e através desse remédio o homem ficaria curado da lepra e estaria saudável e feliz, independente, senhor de si mesmo, capaz de ir onde quisesse. Então, ele talvez visse um outro leproso com feridas e chagas nos membros, sendo devorado por vermes, coçando as crostas das feridas com as unhas, cauterizando as feridas do corpo com carvão em brasa. O que você pensa, Magandiya? Aquele homem invejaria aquele leproso pelo seu carvão em brasas ou pelos remédios que ele estivesse usando?”

“Não, Mestre Gotama. Por que isso? Porque quando há enfermidade, o remédio tem que ser usado, e quando não há enfermidade o remédio não tem que ser usado.”

14. “Da mesma forma, Magandiya, no passado quando eu vivia a vida em família… (igual ao verso12)… Como eu me deleito nisso, não invejo o que é inferior, nem sinto prazer naquilo.

15. “Suponha, Magandiya, que houvesse um leproso com feridas e chagas nos membros, sendo devorado por vermes, coçando as crostas das feridas com as unhas, cauterizando as feridas do corpo com carvão em brasa. Então os seus amigos e companheiros, seus pares e parentes, trouxessem um médico para tratar dele. O médico prepararia um remédio para ele, e através desse remédio o homem ficaria curado da lepra e estaria saudável e feliz, independente, senhor de si mesmo, capaz de ir onde quisesse. Então dois homens fortes o agarrassem pelos dois braços e o arrastassem na direção de uma cova com carvão em brasa. O que você pensa, Magandiya? Aquele homem iria contorcer o corpo nesta e naquela direção?”

“Sim, Mestre Gotama. Por que isso? Porque aquele fogo é de fato doloroso de tocar, ardente e com calor intenso.”

“O que você pensa, Magandiya? Apenas agora aquele fogo é doloroso de tocar, ardente e com calor intenso, ou antes também aquele fogo era doloroso de tocar, ardente e com calor intenso?”

“Mestre Gotama, aquele fogo agora é doloroso de tocar, ardente e com calor intenso, e antes também aquele fogo era doloroso de tocar, ardente e com calor intenso. Pois quando aquele homem era um leproso com feridas e chagas nos membros e era devorado por vermes, coçando as crostas das feridas com as unhas, as suas faculdades estavam debilitadas; dessa forma, embora o fogo na verdade fosse doloroso de tocar, ele de forma equivocada o percebia como prazeroso.”

16. “Da mesma forma, Magandiya, no passado os prazeres sensuais foram dolorosos de tocar, ardentes e com calor intenso; no futuro os prazeres sensuais serão dolorosos de tocar, ardentes e com calor intenso; e agora no presente os prazeres sensuais são dolorosos de tocar, ardentes e com calor intenso. Mas esses seres que não estão livres da cobiça pelos prazeres sensuais, que estão sendo devorados pelo desejo pelos prazeres sensuais, queimando com a febre pelos prazeres sensuais, que estão se entregando aos prazeres sensuais, estão com as faculdades debilitadas; dessa forma, embora os prazeres sensuais sejam na verdade dolorosos de tocar, eles de forma equivocada os percebem como prazer. [4]

17. “Suponha, Magandiya, que houvesse um leproso com feridas e chagas nos membros, sendo devorado por vermes, coçando as crostas das feridas com as unhas, cauterizando as feridas do corpo com carvão em brasa; quanto mais ele coçasse as crostas e cauterizasse seu corpo, mais asquerosas, mais mal cheirosas e mais infectadas ficariam as feridas, no entanto ele descobriria uma certa dose de satisfação e prazer ao coçar suas feridas. Da mesma forma, Magandiya, seres que não estão livres da cobiça pelos prazeres sensuais, que estão sendo devorados pelo desejo pelos prazeres sensuais, que estão queimando com a febre pelos prazeres sensuais, ainda se entregando aos prazeres sensuais; quanto mais esses seres se entregarem aos prazeres sensuais, mais aumentará a sua cobiça pelos prazeres sensuais e mais eles serão queimados pela febre pelos prazeres sensuais, eles no entanto descobrem uma certa dose de satisfação e prazer na dependência desses cinco elementos do prazer sensual.

18. “O que você pensa, Magandiya? Você alguma vez viu ou ouviu um rei, ou o ministro de um rei, desfrutando do prazer, provido e dotado dos cinco elementos do prazer sensual que, sem abandonar o desejo pelos prazeres sensuais, sem remover a febre pelos prazeres sensuais, foi capaz de permanecer livre da sede, com a mente em paz no seu interior, ou que é capaz ou que será capaz de assim permanecer?” – “Não, Mestre Gotama.”

“Muito bem, Magandiya. Eu tampouco vi ou ouvi um rei, ou o ministro de um rei, desfrutando do prazer, provido e dotado dos cinco elementos do prazer sensual que, sem abandonar o desejo pelos prazeres sensuais, sem remover a febre pelos prazeres sensuais, foi capaz de permanecer livre da sede, com a mente em paz no seu interior, ou que seja capaz, ou que será capaz de assim permanecer. Ao contrário, Magandiya, aqueles contemplativos ou brâmanes que permaneceram ou permanecem ou permanecerão livres da sede, com a mente em paz no seu interior, todos assim o fazem depois de terem compreendido como na verdade é a origem, a cessação, a gratificação, o perigo e a escapatória no caso dos prazeres sensuais, e é depois de abandonar o desejo pelos prazeres sensuais e remover a febre pelos prazeres sensuais que eles permanecem ou permanecerão livres da sede, com a mente em paz no seu interior.”

19. Então naquele ponto o Abençoado pronunciou estes versos:

“O melhor de todos os ganhos é a saúde,
Nibbana é a felicidade máxima,
o caminho óctuplo é o melhor dos caminhos,
pois ele conduz com segurança ao imortal.”

Quando isso foi dito, o errante Magandiya disse para o Abençoado: “É maravilhoso, Mestre Gotama, é admirável quão bem isso foi dito pelo Mestre Gotama:

‘O melhor de todos os ganhos é a saúde,
Nibbana é a felicidade máxima’

Nós também ouvimos isso ser dito por errantes do passado na tradição dos mestres, e é a mesma coisa, Mestre Gotama.”

“Mas, Magandiya, quando você ouviu isso ser dito por errantes do passado na tradição dos mestres, o que é a saúde, o que é Nibbana?”

Quando isso foi dito, o errante Magandiya esfregou os membros com as mãos e disse: “Isto é saúde, Mestre Gotama, isto é Nibbana; pois eu agora estou saudável e feliz e nada me aflige.” [5]

20. “Magandiya, suponha que houvesse um homem cego que não pudesse enxergar as formas escuras e claras, que não pudesse enxergar as formas azuis, amarelas, vermelhas ou rosa, que não pudesse enxergar o que fosse regular ou irregular, não pudesse enxergar as estrelas ou o sol e a lua. Pode ser que ele ouvisse um homem com boa visão dizendo: ‘Bom, senhores, deveras é um tecido branco, belo, imaculado e limpo!’ e ele sairia em busca de um tecido branco. Então um homem o trapacearia com um tecido sujo, manchado, assim: ‘Bom homem, aqui está para você um tecido branco, belo, imaculado e limpo.’ E ele o aceitaria e vestiria, e estando satisfeito diria estas palavras de satisfação: ‘Bom, senhores, deveras é um tecido branco, belo, imaculado e limpo!’ O que você pensa, Magandiya? Quando aquele homem cego de nascença aceitou aquele tecido sujo, manchado, vestiu-o e satisfeito disse estas palavras de satisfação: ‘Bom, senhores, deveras é um tecido branco, belo, imaculado e limpo!’ – ele assim o fez sabendo e vendo, ou por fé no homem com boa visão?”

“”Venerável senhor, ele teria feito isso sem saber e sem ver, por fé no homem com boa visão.”

21. “Da mesma forma, Magandiya, os errantes de outras seitas são cegos e sem visão. Eles não sabem o que é saúde, eles não vêm Nibbana, apesar disso proclamam estes versos:

‘O melhor de todos os ganhos é a saúde,
Nibbana é a felicidade máxima’

Estes versos foram proclamados pelos Abençoados, Perfeitamente Iluminados do passado:

‘O melhor de todos os ganhos é a saúde,
Nibbana é a felicidade máxima,
o caminho óctuplo é o melhor dos caminhos,
pois ele conduz com segurança ao imortal.’

Agora, aos poucos, esses versos se tornaram conhecidos entre as pessoas comuns. [6] E embora este corpo, Magandiya, seja uma enfermidade, um tumor, uma flecha, uma calamidade e uma aflição, referindo-se a este corpo você diz: ‘Isto é saúde, Mestre Gotama, isto é Nibbana.’ Você não tem aquela nobre visão, Magandiya, através da qual você possa saber o que é saúde e ver Nibbana.”

22. “Eu tenho confiança no Mestre Gotama assim: ‘Mestre Gotama é capaz de ensinar-me o Dhamma de tal forma que eu possa vir a saber o que é saúde e ver Nibbana.’”

“Magandiya, suponha que houvesse um homem cego que não pudesse enxergar as formas escuras e claras… ou o sol e a lua. Então, os seus amigos e companheiros, seus pares e parentes, trouxessem um médico para tratar dele. O médico lhe prepararia um remédio e através desse remédio a visão do homem não surgiria e não se purificaria. O que você pensa, Magandiya, aquele médico iria obter apenas fadiga e enervação?” – “Sim, Mestre Gotama.” – “Da mesma forma, Magandiya, se eu lhe ensinasse o Dhamma desta forma: ‘Isto é saúde, isto é Nibbana,’ você poderá não saber o que é saúde e poderá não ver Nibbana e isso seria fatigante e problemático para mim.”

23. “Eu tenho confiança no Mestre Gotama assim: ‘Mestre Gotama é capaz de ensinar-me o Dhamma de tal forma que eu possa vir a saber o que é saúde e ver Nibbana.’”

“Magandiya, suponha que houvesse um homem cego que não pudesse enxergar as formas escuras e claras… ou o sol e a lua. Pode ser que ele ouvisse um homem com boa visão dizendo: ‘Bom, senhores, deveras é um tecido branco, belo, imaculado e limpo!’ e ele sairia em busca de um tecido branco. Então um homem o trapacearia com um tecido sujo, manchado, assim: ‘Bom homem, aqui está para você um tecido branco, belo, imaculado e limpo.’ E ele o aceitaria e vestiria. Então os seus amigos e companheiros, seus pares e parentes, trariam um médico para tratar dele. O médico prepararia um remédio – eméticos e purgativos, pomadas e contra-pomadas e tratamento nasal – e através desse remédio a visão do homem surgiria e se purificaria. Junto com o surgimento da sua visão, o desejo e apreço por aquele tecido sujo e manchado seriam abandonados; então é possível que ele ardesse de indignação e inimizade em relação aquele homem e é possível que ele pensasse que deveria mat­á-lo assim: ‘De fato, durante muito tempo eu fui enganado, trapaceado e defraudado por esse homem com este tecido sujo e manchado quando ele me disse: “Bom homem, aqui está para você um tecido branco, belo, imaculado e limpo.’”

24. “Da mesma forma, Magandiya, se eu lhe ensinasse o Dhamma desta forma: ‘Isto é saúde, isto é Nibbana,’ é possível que você saiba o que é saúde e veja Nibbana. Junto com o surgimento da sua visão, é possível que o desejo e cobiça pelos cinco agregados influenciados pelo apego seja abandonado. Então, talvez você pense: ‘De fato, durante muito tempo eu fui enganado, trapaceado e defraudado por esta mente. Pois ao me apegar, eu estava me apegando apenas à forma material, eu estava me apegando apenas à sensação, eu estava me apegando apenas à percepção, eu estava me apegando apenas às formações, eu estava me apegando apenas à consciência. [7] Com o meu apego como condição, ser/existir [surge]; com o ser/existir como condição, nascimento; com o nascimento como condição, envelhecimento e morte, tristeza, lamentação, dor, angústia e desespero surgem. Essa é a origem de toda essa massa de sofrimento.’”

25. “Eu tenho confiança no Mestre Gotama assim: ‘Mestre Gotama é capaz de ensinar-me o Dhamma de tal forma que eu possa me levantar do meu assento curado da minha cegueira.’”

“Então, Magandiya, associe-se com homens verdadeiros. Se você se associar com homens verdadeiros, irá ouvir o Dhamma verdadeiro. Ao ouvir o Dhamma verdadeiro, você irá praticar de acordo com o Dhamma verdadeiro. Quando você pratica de acordo com o Dhamma verdadeiro, você irá conhecer e ver por você mesmo assim: ‘Essas são enfermidades, tumores e flechas; mas aqui essas enfermidades, tumores e flechas cessam sem deixar vestígios. [8] Com a cessação do meu apego, cessa o ser/existir; com a cessação do ser/existir, cessa o nascimento; com a cessação do nascimento, envelhecimento, morte, tristeza, lamentação, dor, angústia e desespero tudo cessa. Essa é a cessação de toda essa massa de sofrimento.”

26. Quando isso foi dito o errante Magandiya disse: “Magnífico, Mestre Gotama! Magnífico, Mestre Gotama! Mestre Gotama esclareceu o Dhamma de várias formas, como se tivesse colocado em pé o que estava de cabeça para baixo, revelasse o que estava escondido, mostrasse o caminho para alguém que estivesse perdido ou segurasse uma lâmpada no escuro para que aqueles que possuem visão possam ver as formas. Eu busco refúgio no Mestre Gotama, no Dhamma e na Sangha dos bhikkhus. Eu receberia a admissão na vida santa sob o Abençoado e a admissão completa.”

27. “Magandiya, alguém que anteriormente tenha pertencido a uma outra seita e que quer ser admitido na vida santa e a admissão completa neste Dhamma e Disciplina terá um período de noviciado de quatro meses. Ao final dos quatro meses, se os bhikkhus estiverem satisfeitos com ele, eles lhe darão a admissão na vida santa e também a admissão completa como bhikkhu. Mas eu reconheço diferenças entre indivíduos neste assunto.”

“Venerável senhor, se aqueles que pertenceram anteriormente a uma outra seita e querem a admissão na vida santa e a admissão completa nesse Dhamma e Disciplina vivem como noviços durante quatro meses e ao final dos quatro meses os bhikkhus que estiverem satisfeitos com ele lhe darão admissão na vida santa e também a admissão completa como bhikkhu, eu viverei como noviço durante quatro anos. Ao final dos quatro anos, se os bhikkhus estiverem satisfeitos, que me dêem a admissão na vida santa e a admissão completa como bhikkhu”

28. Então o errante Magandiya recebeu a admissão na vida santa sob o Abençoado e ele recebeu a admissão completa como bhikkhu. E depois da sua admissão completa, permanecendo só, isolado, diligente, ardente e decidido, em pouco tempo, ele alcançou e permaneceu no objetivo supremo da vida santa pelo qual membros de um clã deixam a vida em família pela vida santa, tendo conhecido e realizado por si mesmo no aqui e agora. Ele soube: “O nascimento foi destruído, a vida santa foi vivida, o que deveria ser feito foi feito, não há mais vir a ser a nenhum estado.” E o venerável Magandiya se tornou mais um dos arahants.


Notas:

[1] MA explica que ele tinha a idéia de que o “crescimento” deve ser realizado através dos seis meios dos sentidos, experimentando quaisquer objetos sensuais que ainda não tenham sido experimentados antes, sem se apegar àqueles que já são conhecidos. Outra interpretação possível para o termo em Pali, (bhunahuno), seria “repressor”, ou seja, Magandiya estaria acusando o Buda de ser um repressor. A idéia de Magandiya, portanto, parece próxima da atitude contemporânea na qual a intensidade e variedade das experiências é o bem último e estas devem ser perseguidas sem inibições ou restrições. A razão para a desaprovação pelo Buda ficará evidente no verso 8. [Retorna]

[2] O seu pai, o rei, proveu Siddhattha Gotama com três palácios e um séquito de mulheres na esperança de mantê-lo confinado à vida leiga e assim distraí-lo das idéias de renúncia. [Retorna]

[3] MA: Isto é dito referindo-se à realização do fruto de arahant baseado no quarto jhana. [Retorna]

[4] A expressão viparitasañña alude à “percepção distorcida” (saññavipallasa) de perceber o prazer no que na verdade é doloroso. MT diz que os prazeres sensuais são dolorosos porque despertam as contaminações que causam sofrimento e porque produzem frutos dolorosos no futuro.[Retorna]

[5] É evidente que Magandiya compreende o verso de acordo com o entendimento incorreto de número cinqüenta e oito que consta no Brahmajala Sutta –: “Na medida em que este eu, estando provido e dotado com os cinco elementos do prazer sensual, desfruta deles, então é assim que o eu realiza o nibbana mais elevado aqui e agora.”[Retorna]

[6] MA: O verso completo havia sido recitado pelos Budas anteriores para as quatro assembléias. O público em geral o memorizou como “um verso que diz respeito ao que é bom.” Depois que o último Buda morreu, o verso se espalhou entre os errantes que foram capazes de apenas preservar as duas primeiras linhas nos seus livros.[Retorna]

[7] O enfático yeva, “apenas,” implica que ele estava se apegando à forma material, sensação ,etc., de forma enganosa como se fossem “eu,” “meu,” e “meu eu.” Com o surgimento da visão – uma expressão metafórica para o caminho do entrar na correnteza – a idéia da identidade é erradicada e ele compreende que os agregados são meros fenômenos vazios desprovidos da característica de um eu que ele lhes havia atribuído.[Retorna]

[8] “Essas” se referem aos cinco agregados.[Retorna]

fonte: http://www.acessoaoinsight.net


8 de janeiro de 2013

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