Jardim dos Mestres

Sobre a Identificação com Pensamentos

É importante manter a mente limpa. É importante que não deixemos os maus pensamentos penetrarem nossas mentes.

Após termos observado a doutrina dos múltiplos Eus, após termos experimentado diretamente, ao menos uma vez, a pluralidade desses Eus dentro de nós, podemos, enfim, compreender a identificação com os pensamentos, podemos explorar a experiência direta do que vem a ser, na verdade, a identificação com os pensamentos.

Compreendendo um Eu, observamos, de forma direta, pensamentos, conceitos, explicações, padrões, experiências e lembranças a ele associados.

Da mesma forma, podemos também observar que muito dos pensamentos que passam diariamente por nossa mente não são nossos, mas destes Eus. No entanto, muitas vezes acreditamos no que estamos pensando, e ficamos apaixonados por nós mesmos, apaixonados pelos pensamentos que passam por nossa mente, ou seja, nos identificamos.

Diz Samael Aun Weor em “Tratado de Psicologia Revolucionária”:

Do centro intelectual surgem diversos pensamentos provenientes não de um Eu permanente como supõem nescicamente os ignorantes ilustrados, mas dos diferentes “Eus” em cada um de nós.

Quando um homem está pensando, crê firmemente que ele em si mesmo e por si mesmo está pensando.

Sabemos que um Eu magoado, por exemplo, tem suas histórias, suas canções. Cientes disto, o que temos de fazer é procurar compreender por que acreditamos que os pensamentos de mágoa que atormentam nossas idéias são pensamentos nossos, por que nos identificamos com tais pensamentos e nos sentimos magoados com isso. Quando um Eu magoado toma conta de nosso centro intelectual e nós nos identificamos, tendemos a acreditar que este Eu é realmente parte de nós.

Enquanto não nos dissociarmos destes Eus, enquanto não tomarmos verdadeira consciência de que existem muitos Eus dentro de nós, continuaremos a nos identificar com esses Eus. E, assim, o sofrimento será inevitável.

Por acreditarmos que todos os pensamentos que passam por nossa mente são nossos, vivemos em conflito interno, sofremos a cada vez que somos assaltados por desejos antagônicos, frustramo-nos  quando oscilamos de um estado a outro, da euforia à tristeza. Isto ocorre porque não conseguimos compreender, perceber, que não somos nós. Somos incapazes de reverter tal situação em benefício de nosso auto-conhecimento.

Projetamos nossos defeitos nos outros, identificamo-nos com pensamentos que passam por nossa mente como relâmpagos ou com os mesmos velhos pensamentos carregados de conceitos e preconceitos, valores, rótulos. E nos comportamos de acordo com tais pensamentos.

Enquanto nos deixarmos fascinar por nossos pensamentos, lindos e floridos pensamentos que nutrimos sobre nós mesmos; enquanto estivermos experimentando uma sensação de prazer cada vez maior com eles, inevitavelmente sofreremos diante dos maus pensamentos, nossos e dos outros.

O tempo todo precisamos nos relacionar com os demais. Inevitavelmente, em tais relacionamentos nossos defeitos, mais cedo ou mais tarde,  saltam à vista. Porém, nos mantemos atentos, somos capazes de percebê-los.

Os maus conceitos que fazemos dos outros podem nos deixar predispostos à irritação, à violência, à má vontade. Ocorre que, uma vez identificados com tais pensamentos, antes de começarmos a estabelecer o contato com o outro, já nos mostramos irritados com ele. Em nosso pensamento condicionado, o outro já é culpado antes mesmo de começar a falar, antes mesmo de estar em nossa presença. Uma vez Identificados com tais pensamentos, muitas vezes não conseguimos ouvir ou interpretamos mal o que o outro está dizendo. Esses conceitos, esses preconceitos, não passam de projeções mentais. São pensamentos com os quais nos identificamos fortemente. Não questionamos, porém, que talvez alguns dos conceitos que formamos sobre alguém em nossa mente tenham sido passados por  uma outra pessoa. Desta forma, se alguém nos diz que o outro é de desta ou daquela forma, mesmo sem conhecermos a pessoa em questão, já nos antecipamos agindo condicionados por projeções mentais que nem são nossas, mas de outrem. Formamos opiniões pré-concebidas como: “Ele é orgulhoso”; “Ele é enrolador”; “Lá vem aquele chato!”; “Vou ter que falar com aquele ignorante!”; “Vamos ver do que ele vai reclamar agora”; “Lá vem pergunta idiota novamente”; “Estou aqui ocupado e lá vem ele de novo me atrapalhar com suas bobagens”; “Cuidado com o Fulano, pois ele já fez isso, aquilo e aquele outro”…   Não podemos nos abrir aos nossos maus pensamentos. Mais do que isto, não podemos nos abrir aos maus pensamentos dos outros.

Nossos egos vivem criando problemas onde não existe nada além de uma mera situação.  Infelizmente, somos dados a nos identificar com as múltiplas ilações que a cabeça fabrica e metemos os pés pelas mãos, ao invés de enxergarmos os fatos com clareza e isenção.

Justamente por esta razão, os planos que fazemos para resolvermos nossas pendências, para abordarmos o outro, e que envolvem pensamentos como: “Vou contar isso para Fulano, mas se ele disser aquilo, vai ver só…”; “Acho que ele vai brigar comigo”; “Ele não vai me fazer perder tempo” etc., geram medo, insegurança, dúvida, incerteza, ansiedade. Deixam-nos predispostos à irritação, ao nervosismo, à violência, à grosseria, à brutalidade. São apenas pensamentos, é verdade. Mas, se nos identificamos com eles, já nos surpreendemos planejando maldades, vinganças, violência, brutalidade, antes mesmo de a situação existir.  Tais planos são parte de alguns de nossos dispositivos de defesa. E alimentar esses planos é uma forma criar problemas. Se agimos desta forma, com planos premeditados, não será possível desfrutarmos de relações serenas e espontâneas. Se agimos desta forma é porque estamos presos ao passado e longe do momento presente, estamos reagindo a situações já vividas.

Em síntese, se nos identificamos com os maus pensamentos, acabamos nos irritando sem mesmo sabermos ao certo o motivo de tal irritação, sem consciência dos fatores que geram tal reação, pois não paramos um momento para nos perguntarmos o porquê da situação e de nossa irritação.

Por mais que as pessoas sejam realmente como pensamos, como supomos que são, e nossa opinião sobre ela não é das melhores, ainda assim, se nos conhecemos bem e se temos em nós o sentimento de compaixão, bondade, paciência, tolerância, não ficaremos irritados, nervosos, irados, não agiremos de forma violenta, de forma bruta, com grosseria.

Como já mencionado anteriormente, quando nos identificamos com nossos pensamentos, nosso comportamento passa a ser condicionado, mecânico. Se formamos um bom conceito a respeito de uma determinada pessoa, consequentemente, vamos ter com ela um bom contato, um bom relacionamento bom, uma boa interação;  vamos nos dirigir a essa pessoa com educação, atenção e alegria. Ao contrário, se formamos um mau conceito a respeito de alguém, o resultado inevitável será um mau contato, um mau relacionamento, uma má interação; vamos nos dirigir a essa pessoa de forma grosseira, com irritação, com má vontade.

Os conceitos que fazemos de terceiros não passam de idéias, valores, rótulos, são apenas pensamentos. É como se estivéssemos nos relacionando com a fotografia de uma pessoa ou de uma situação, com a imagem mental de uma pessoa ou de uma situação, e não com a pessoa ou a situação em si. Olhar para uma fotografia é sempre olhar para o passado. O ego está preso ao tempo. Se agimos desta maneira, estamos reagindo ao passado. Não estamos agindo efetivamente no presente. Portanto, não será esta uma ação adequada, pois nada de real está acontecendo no agora. Precisamos perceber este processo.

Ficamos com vergonha por nos identificarmos com o pensamento que de a situação é vergonhosa. Ficamos ofendidos por nos identificarmos com o pensamento de que uma ofensa foi dirigida para nós, por estarmos identificamos com pensamentos, o conceito de que certas palavras, certas formas de expressão, são ofensivas. Ficamos com medo por nos identificarmos com o pensamento de que a situação é temerosa.

Deveríamos analisar como seriam as mesmas situações se tais pensamentos não nos habitassem a mente, ou mesmo se, apesar de já terem passado por nossa cabeça, não tivéssemos nos identificado com eles.

Deveríamos analisar como seriam as mesmas situações se não tivéssemos em nós apenas o desejo de experimentar sensações boas, rejeitando, repudiando, evitando qualquer possibilidade de virmos a nos submeter  a sensações ruins.

A identificação com conceitos, padrões, valores, que permeiam nossos pensamentos e idéias, embota a mente. A identificação com pensamento é a própria crença num Eu permanente, o que se contrapõe inteiramente à doutrina Gnóstica e também à doutrina Budista.

Para começarmos a reduzir gradativamente a identificação com os pensamentos, a prática meditativa de silenciar a mente é a melhor opção. Mas não podemos, de forma alguma, deixar de lado a prática da meditação reflexiva, analítica, e as súplicas à Divindade, ao Cristo Interno, a Mãe Divina, visando à morte dos Eus.

Fábio Ferreira Balota


8 de outubro de 2014

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