Jardim dos Mestres

Devoção e Veneração

A devoção precisa ser profunda e verdadeira, não pode ser apenas adoração de projeções mentais.

A devoção é a melhor forma de acabar com a auto importância, acabar com este comportamento em que nos colocarmos acima de tudo e de todos, mais importantes que tudo e todos.

A devoção é a melhor forma de acabar com o amor próprio, acabar com esta auto adoração, com a adoração a personalidade, onde atribuímos todas as nossas conquistas, realizações, a personalidade, como se ela tivesse algum poder.

Acreditamos que criamos todas as coisas, nos julgamos senhores de tudo, quando nada criamos. Enquanto continuamos tentando nos asenhorar das coisas materiais, não podemos nos tornar verdadeiros devotos.

O homem é infeliz e sofre porque virou as costas para Deus, porque tem raiva de Deus, porque não tem devoção alguma a Divindade. Muitos se consideram injustiçados então sentem raiva Dele de forma direta. Mas, a raiva sutil de Deus é muito mais destrutiva. Podemos expressar raiva de Deus através de nossas falsas adorações, mesmo em templos, em rituais, pois muitas vezes estamos dizendo palavras vazias enquanto nossa mente esta a julgar, a planejar suas vinganças, suas maldades, esta a criticar o devoto do lado, sua roupa, sua forma de orar, esta a reclamar do templo. Podemos ver a raiva de Deus na não aceitação, na culpa, na preocupação, reclamação, crítica, maledicência, revolta, julgamento dos outros, na própria raiva, enfim, a lista é grande, o fato é que nós dormimos profundamente.

Muitas vezes queremos melhorar, mudar, evoluir espiritualmente, apenas por prazer, é verdade que é um prazer diferente, mas ainda sim é um prazer, somente a devoção, a entrega, é que pode mudar este quadro.  Precisamos entregar os resultados do nosso trabalho aos pés de nosso Pai Interno. Precisamos dedicar o próprio trabalho ao nosso Pai Interno.

A busca de conhecimento material, de desenvolvimento de poderes da mente, são em ultima análise, para satisfação dos sentidos, sendo assim tal busca prolonga a necessidade de existência, aumentando a miséria, o que é ignorância, estupidez.

Existem muita adoração com desejo de se conseguir benefícios materias, o que é uma perversão, uma deturpação, da religião. Desta forma nos prendemos cada vez mais as misérias da existência material.

A devoção pura, renunciada, é o que nos se deve buscar. A devoção não pode ser praticada em troca de ganho material, de desfrute dos sentidos, pois isso cria grandes obstáculos no caminho.

O objetivo da vida é se livrar das misérias da vida e não cultivá-las, fortalece-las, prolongá-las.

Todo cultivo de conhecimento culmina no serviço devocional.

Devoção é o amar a Deus sobre todas as coisas, o que desmonta a auto importância e o amor próprio. Como diz Jesus no deserto ao ser tentado pela segunda vez “Ao Senhor, teu Deus, adorarás e só a ele servirás.”, mas nós adoramos mais a personalidade, ao ego, temos uma enorme preocupação com o que pode acontecer com esta entidade psicológica que criamos e adoramos.

Utilizando uma frase de Pema Chödrön, podemos dizer que se tornar um devoto, se entregar a Divindade, é como “colocar a cabeça na boca do crocodilo”.

Devoção é o amor a Divindade. Devoção é o apego a Divindade e, este é o único apego que é benéfico, mais do que isso é o apego que desfaz os demais apegos. Devoção é a paixão pela Divindade e, quando realmente nos entregamos a uma paixão, não sabemos o que pode acontecer.

A conversa entre Bill Moyers e Joseph Campbell em “O Poder do Mito” fala um pouco sobre esta entrega:

Moyers – “Qual é o significado das provações, dos testes, das experiências penosas do herói?”

Campbell – “Se você colocar as coisas em termos de intenções, as provações são concebidas para ver se o pretendente a herói pode realmente ser um herói. Será que ele está à altura da tarefa? Será que é capaz de ultrapassar os perigos? Será que tem a coragem, o  conhecimento, a capacidade que o habilitem a servir?”

Moyers – “Na nossa cultura de religião fácil, atingida sem esforço, parece que esquecemos que as três grandes religiões ensinam que as provações da jornada heróica são parte significativa da vida, e que não há recompensa sem renúncia, sem pagar o preço. O Alcorão diz: ‘Você acha que pode ter acesso ao Jardim das Delícias sem passar pelas mesmas provações daqueles que o antecederam?’ E Jesus diz, no Evangelho de São Mateus: ‘Grande é a porta e estreito o caminho que conduz à vida, e poucos os que o encontram’. E os heróis da tradição judaica enfrentam duros testes antes de chegar à redenção.”

Campbell – “Ao se dar conta do verdadeiro problema – se perder, se doar a algum objetivo mais elevado, ou a outrem – você percebe que essa, em si, é a provação suprema. Quando deixamos de pensar prioritariamente em nós mesmos e em nossa auto-preservação, passamos por uma transformação de consciência verdadeiramente heróica. E todos os mitos lidam justamente com a transformação da consciência, de um tipo ou de outro. Você vinha pensando de um certo modo, agora tem de pensar de um modo diferente.”

Moyers – “Como é que a consciência se transforma?”

Campbell – “Ou pelas próprias provações ou por revelações iluminadas. Tudo gira em torno de provações e revelações.”

hanumanPrecisamos ter uma atitude mística, uma atitude voltada para o espiritual.

Talvez uma das maiores mensagens dos evangelhos, seja a mensagem que não foi dita, não foi diretamente expressa em palavras, mas foi expressa em ação, em exemplo, Jesus sempre se dirigia ao Pai, sempre oferecia os frutos de seus trabalhos, seus esforços ao Pai, sempre dizia que o Pai é que fazia as obras.

A prática de ações fruitivas, nos prendem a matéria, pois tem suas reações boas ou más. A prática de boas ações traz prosperidade material, a prática de más ações traz aflição, sofrimento material. Em ultima análise a prática de ações fruitivas é a busca de sofrimento.

Muito dos que eram por Jesus curados o seguiam, glorificando ao Senhor. Mas nós seguimos glorificando a personalidade, nos achando escolhidos, não temos devoção alguma, não glorificamos Aquele que nos tira da cegueira e nos faz enxergar, nos faz ver a verdade.

É dito em um trecho da versão brasileira de “Ocultismo Prático”, publicada pela Editora Teosófica:

“A pureza do coração é uma condição necessária para o atingimento do ‘Conhecimento do Espírito’. Há dois meios principais pelos quais essa purificação pode ser atingida. Em primeiro lugar, afasta persistentemente todo mau pensamento; e em segundo, mantém a mente tranqüila sob quaisquer condições, nunca te agitando ou te irritando por qualquer coisa. Descobrir-se-á, assim, que estes dois meios de purificação são melhor estimulados pela devoção e pela caridade. Não devemos nos manter ociosos, sem tentar fazer alguma coisa para progredir, só porque não nos sentimos puros. Que todos tenham aspirações, e que trabalhem com o devido empenho; no entanto, devem trabalhar  no reto caminho, cujo primeiro passo é purificar o coração.”

“Através da fé o coração é purificado das paixões e da insensatez; daí surge o domínio do corpo, e, por último, a subjugação dos sentidos.”

Quando percebemos nossa ignorância, nossa nulidade, quando abrimos espaço para errar, quando abrimos mão do controle, então nos abrimos para a incerteza. Somente a incerteza pode nos trazer confiança, o controle não pode nos dar segurança, confiança, a própria idéia de controle trás consigo a insegurança, o medo do descontrole. Se entregar para incerteza é fé, é devoção. É como dar um passo para um abismo, somente a fé pode nos sustentar, e quando damos este passo, sentimos a liberdade, a paz, o amor.

 

Canto I

  1. Ó ganhador de riquezas, liberte-se do trabalho motivado pelo lucro mantendo-se bem distante das ações abomináveis. Os míseros avarentos é que querem desfrutar dos resultados da ação. Quem é consciente de Mim serve-Me com devoção.
  1. A pessoa que se ocupa em servir com devoção encontra-se liberada de todas as reações. Por isso pratique yoga que é fazer tudo com arte.
  1. Os que fazem seu trabalho com inteira devoção, sem apego a resultados, conseguem se libertar do nascimento e da morte atingindo a perfeição.

 

Canto III

  1. Quem possui conhecimento da Realidade Absoluta, Arjuna de braços fortes, não se ocupa na procura dos prazeres dos sentidos, pois bem sabe a diferença entre agir por devoção ou apegado aos resultados.
  1. Por estarem confundidos pelas três qualidades da matéria, os ignorantes se ocupam com os assuntos mundanos, ficando muito apegados. Não deve, no entanto, o sábio por causa disso agitá-los. Eles agem desse modo por falta de entendimento.
  1. Por esse motivo, Arjuna, com a mente fixa em Mim, sem desejar nada em troca, e ofertando-Me os teus atos, lute sem desanimar!
  1. Quem executa os deveres conforme os Meus preceitos, quem segue Minhas lições com muita fé e devoção, sem se levar pela inveja, fica livre da prisão do trabalho interesseiro.
  1. Mas os que, devido à inveja, não praticam Meus preceitos, privam-se completamente de todo o conhecimento, malogrando seus esforços de atingir a perfeição.

 

Canto V

  1. O devoto que renuncia ao fruto de suas ações consegue a paz eterna. Ao contrário, o homem sem devoção, que fustigado pelo desejo se apega ao fruto de suas obras, mantém-se prisioneiro (de seus próprios atos).

 

Canto VII

  1. Qualquer que seja a forma de divindade a que um devoto pretenda render culto com verdadeira fé, sou Eu realmente quem inspira essa fé inquebrantável.
  1. Cheio dessa fé. o devoto procura agradar tal divindade, servindo-a com esmero e dela consegue a satisfação dos seus desejos. Mas sou Eu que lhe ofereço tais bens.
  1. No entanto, a recompensa obtida por esses homens de pequeno entendimento é limitada. Quem adora os deuses vai aos deuses; quem Me adora vem a Mim.

 

Canto IX

  1. Os insensatos, desconhecendo minha natureza superior, quando estou revestido por uma forma humana, Me desprezam, a Mim, soberano senhor de todas as criaturas.
  1. Privados de entendimento, toda sua ação, seu conhecimento, suas esperanças são vãs; eles participam da natureza râkshasas e asuras.
  1. Mas os homens de alma elevada, filho de Prithâ, participando de minha natureza divina e sabendo que Eu sou a fonte eterna e inesgotável de todos os seres, Me adoram com o pensamento fixo em Mim.
  1. Glorificando-Me sem cessar, lutando com afinco, firmes em seus votos e prosternando-se diante de Mim. Me adoram com devoção fervorosa e constante.
  1. Aqueles que, vivendo com a atenção sempre fixa em Mim. Me adoram sem pensar jamais em outro ser, ofereço plena segurança de bem-aventurança perpétua.
  1. Mesmo aqueles que adoram outras divindades com fé e devoção ardorosas, Me adoram, ó filho de Kuntî, mas não de acordo com a verdadeira lei.
  1. Porque Eu sou o senhor de todos os sacrifícios e aquele que os recebe, mas tais homens não Me conhecem em essência e por isso caem.
  1. Aqueles que adoram os deuses vão aos deuses; aqueles que servem os antepassados vão a eles, aqueles que cultuam os espíritos elementares vão aos espíritos elementares, mas aqueles que Me adoram vêm a Mim.
  1. Se alguém Me oferece com devoção uma folha, uma flor, um fruto ou apenas água, aceito tal presente de uma alma piedosa e sincera.
  1. Assim, pois, filho de Kuntî, qualquer coisa que faças, qualquer alimento que comas, qualquer objeto que ofereças em sacrifício, qualquer esmola que dês, qualquer mortificação a que te submetas, faça-o como uma oferenda a Mim.
  1. Desta forma estarás livre das cadeias da ação, sejam seus frutos bons ou maus. Aplicando-te com fervor à Yoga e à renúncia, estarás livre e virás a Mim.
  1. Eu sou o mesmo para todos os seres, ninguém Me é querido ou odioso; mas aqueles que Me adoram com devoção estão em Mim e Eu estou neles.
  1. Mesmo o homem mais depravado, se Me adora com dedicação exclusiva, deve ser considerado um justo, porque anseia pela verdade.
  1. Um homem assim logo se torna virtuoso e se encaminha para a paz eterna. Tem certeza, filho de Kuntî, que quem Me ama, não se perde jamais.
  1. Porque aqueles que buscam refúgio em Mim, ó filho de Prithâ, mesmo que tenham sido engendrados no pecado, mulheres, vaishyas e até os shüdras chegam ao fim supremo.
  1. Com muito mais razão, pois, os santos brâmanes e os piedosos rishis reais! Adora-Me, pois, neste mundo transitório e cheio de amarguras.
  1. Fixa teu pensamento em Mim, prostra-te diante de Mim adorando-me e rendendo-Me culto devoto. Assim unido de coração comigo e considerando-Me como meta suprema, virás a Mim.

 

Canto X

    8.Eu sou a origem de todo ser, de Mim procede a obra do universo. Sabendo disto, os sábios Me adoram em amorosa contemplação.

   9.Com o pensamento fixo em Mim, tendo em Mim concentrada a sua vida, instruindo-se uns aos outros e falando de Mim sem cessar, vivem satisfeitos e felizes.

   10.A estes homens que se consagram à união mística e Me servem com amor. Eu lhes inspiro aquela devoção baseada no conhecimento, através da qual chegam a mim.

  11.Movido pela compaixão e residindo em sua alma, dissipo neles as trevas nascidas da ignorância, através da luz refulgente da sabedoria.

 

Canto XII

  1. Aqueles, cujo pensamento se dirige ao Imanifesto, enfrentam grandes dificuldades, pois os seres encarnados, só com muito trabalho, alcançam a meta imanifesta.
  1. Mas aqueles que Me entregam todos os seus atos, para quem Eu sou a meta suprema de suas aspirações, e que, meditando em Mim, Me adoram com devoção exclusiva,
  1. Eu os salvo sem demora do oceano da existência ligada à morte, filho de Prithâ, pois seu pensamento está fixo em Mim.
  1. Dirige pois, só a Mim teu pensamento, deposita em Mim tua razão e, sem dúvida, viverás em Mim depois da morte.
  1. Mas se não tens aptidão para fixar com persistência teu pensamento em Mim, procura alcançar-me, ó Dhananjaya, com a Yoga da perseverança.
  1. Se tampouco te sentires capaz de tal esforço, dedica-te à ação em minha honra; executando tuas obras por amor a Mim, chegarás à perfeição.
  1. Mas se isso ainda exceder as tuas forças, recorre então à devoção a Mim e subjugando-te a ti mesmo, renuncia ao fruto de tuas obras.
  1. Porque, na verdade, melhor que o esforço perseverante é o conhecimento; melhor que o conhecimento é a meditação, e preferível à meditação é a renúncia ao fruto de tuas obras.
  1. O homem que não odeia nenhum ser vivente, benévolo e compassivo, desinteressado e isento de amor-próprio, inalterável na ventura e na desventura, sofrido,
  1. sempre contente e aplicado à Yoga, dono de si mesmo, firme em seu propósito, com o coração e o entendimento dedicados a Mim. tal homem é amado por Mim.
  1. Aquele que não perturba o mundo, nem se deixa perturbar por ele, que está livre das emoções nascidas da alegria, aversão, temor e inquietude, é amado por Mim.
  1. O homem indiferente (às coisas terrenas), puro, correto, desapaixonado, de ânimo sereno, que renunciou à toda ação e é Meu devoto, é amado por Mim.
  1. Aquele que não sente prazer ou aversão, não abriga tristeza ou desejos, que não distingue acontecimentos felizes e infelizes e é Meu devoto, é amado por Mim.
  1. Aquele que se mostra o mesmo diante do amigo e do inimigo, inalterável na honra e na desonra, impassível no frio e no calor, no sofrimento e no prazer; aquele que está livre de afeições,
  1. que vê da mesma forma a lisonja e o insulto e vive silencioso, contente e feliz com tudo que lhe acontece, sem lugar, mantendo a mente firme e o coração cheio de fervor, tal homem é amado por Mim.
  1. Mas aqueles que fazem de Mim sua finalidade suprema e única e que seguem até o fim, com fé e perseverança, o dharma que acabo de expor e que leva à imortalidade, esses são amados com predileção

12 de dezembro de 2016

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